quinta-feira, 31 de julho de 2008

Cavaco Silva quis dizer o quê? A quem? Aos portugueses ?

Cavaco Silva acaba de fazer uma declaração ao país para dizer que vai devolver o diploma do Estatuto Político-Administrativo dos Açores à Assembleia da República !?
Mas isso era inevitável depois do Tribunal Constitucional lhe ter dado parcialmente razão.
Cavaco tinha dúvidas em 13 normas. O Tribunal Constitucional considerou que dessas 13 oito eram inconstitucionais.
Foi insuficiente para Cavaco?
Com esta intervenção quis o quê ? Pressionar o Tribunal Constitucional para fazer uma análise mais restritiva?
Cavaco está com medo de perder poderes?
Os Açores abriram os telejornais nacionais, em directo, durante largos minutos, mas poucos terão percebido a pertinência desta comunicação ao país, que estava em suspenso à espera de uma "bomba".
É bom que os Açores abram telejornais sem ser por terramotos os outras catástrofes com muito sangue, lágrimas e vítimas...mas para isto parece-me também que não vale a pena.
Carlos Magno comentava há pouco na RTP 1 que "O PR veio mostrar que existe antes das ferias"! Mas a generalidade dos portugueses ficou na mesma. Cavaco existe...mas bem podia ter passado despercebido neste final de tarde estival.
Poderia ter ido a banhos mais cedo que ninguém dava por nada.

Esta foi a comunicação do PR (na íntegra):

1. O Tribunal Constitucional pronunciou-se pela inconstitucionalidade de várias normas do decreto que aprovou a revisão do Estatuto Político-Administrativo dos Açores. Nesse sentido, irei devolver, nos termos da lei, o respectivo diploma à Assembleia da República.Devo, no entanto, comunicar aos portugueses que outras normas me suscitam sérias reservas de natureza político-institucional.
2. Trata-se, acima de tudo, da norma relativa à dissolução da Assembleia Legislativa dos Açores que, inovando em relação ao Estatuto em vigor e em relação ao Estatuto da Madeira, restringe o exercício das competências políticas do Presidente da República, pondo em causa o equilíbrio e a configuração de poderes do nosso sistema político previsto na Constituição.Em devido tempo, alertei vários dirigentes políticos para esta questão.Nos termos da Constituição, a Assembleia Legislativa Regional pode ser dissolvida pelo Presidente da República, ouvidos o Conselho de Estado e os partidos nela representados.O diploma em causa pretende agora consagrar o dever adicional de o Presidente da República ouvir também a Assembleia Legislativa, os seus grupos e representações parlamentares e o Presidente do Governo Regional.Quer isto dizer que o Presidente da República estaria sujeito a mais deveres de audição e consulta no que toca à dissolução da Assembleia Regional dos Açores do que os previstos para a dissolução da Assembleia da República.No caso da Assembleia da República, o Presidente da República, nos termos constitucionais, não precisa de ouvir a Assembleia da República nem o Primeiro-Ministro, mas no caso da Assembleia Legislativa dos Açores teria de ouvir a própria Assembleia Legislativa Regional e o Presidente do Governo Regional.A audição autónoma do Presidente do Governo Regional é tanto mais incompreensível quanto ele tem assento no Conselho de Estado e é aí ouvido pelo Presidente da República.O mesmo se pode dizer relativamente à audição autónoma da Assembleia Legislativa e dos seus grupos parlamentares porquanto, nos termos constitucionais, o Presidente da República já ouve os partidos nela representados.Entendo que é perigoso para o princípio fundamental da separação e interdependência de poderes, que alicerça o nosso sistema político, aceitar o precedente, que poderia ser invocado no futuro, de, por lei ordinária, como é o caso do Estatuto Político-Administrativo dos Açores, se vir a impor obrigações e limites às competências dos órgãos de soberania que não sejam expressamente autorizados pela Constituição da República.Semelhante prática desfiguraria o equilíbrio de poderes, tal como este tem existido, e afectaria o normal funcionamento das instituições da República. É por isso que considero ser meu dever alertar os portugueses.
3. Devo, igualmente, chamar a atenção para um outro ponto conexo com o anterior.No passado dia 10 deste mês foi publicada uma Lei da Assembleia da República sobre o Estatuto do Representante da República nas Regiões Autónomas no qual se estipula, tal como consta da Constituição, que o Representante é nomeado e exonerado pelo Presidente da República, ouvido o Governo.Sobre exactamente o mesmo assunto, o decreto da Assembleia da República que aprova o novo Estatuto dos Açores acrescenta a obrigação do Presidente da República ouvir também a Assembleia Legislativa da Região.Não se questiona a audição da Assembleia Regional na pessoa do seu Presidente. Foi isso que fiz, no início do meu mandato, quando nomeei os Representantes da República para os Açores e para a Madeira – prática que aliás segui quando desempenhei as funções de Primeiro-Ministro e que tenciono manter como Presidente da República.Mas se aquela audição tiver por objecto o próprio órgão colegial podem emergir consequências negativas no processo de designação do Representante.Por um lado, porque pode colocar o Presidente da República no centro de um debate parlamentar regional e, por outro, porque pode fragilizar politicamente o Representante da República e dificultar a escolha de uma personalidade com perfil adequado.
4. Considero, ainda, que merecem reponderação outras normas inovadoras constantes do Estatuto.Por um lado, “o procedimento de audição qualificada” que, pelas vinculações que cria para os órgãos de soberania envolvidos, restringe os seus poderes de decisão, ultrapassando em muito a regulamentação do simples direito de audição previsto na Constituição.Por outro lado, a limitação dos poderes de revisão do Estatuto pela Assembleia da República às normas que tenham sido objecto da iniciativa da Assembleia Legislativa Açoriana implica restrições excessivas ao poder de iniciativa legislativa superveniente dos deputados do parlamento nacional.Face à incerteza que caracteriza os tempos modernos, a possibilidade de petrificação de normas jurídicas constantes do Estatuto, ao ponto de eternizar a sua vigência, deve ser examinada com todo o cuidado.
5. A alteração do Estatuto Político-Administrativo dos Açores visa concretizar o modelo avançado de autonomia resultante da revisão constitucional de 2004. Mas é indispensável que essa alteração se harmonize com a separação de poderes e as competências dos órgãos de soberania consagrados na Constituição da República Portuguesa.

2 comentários:

Rui Rebelo Gamboa disse...

Fiquei com a ligeira impressão que nem o Rodrigues dos Santos, nem mesmo esse Carlos Magno sabiam o que estava mesmo em jogo. O Carlos Magno chegou ao ponto de dizer que is portugueses esperavam algo mais importante, tentando depois remediar o caso com um "não que os Açores não sejam importantes, mas...". Ambos repetiram que Cavaco falou dos Açores devido às eleições regionais. Só quando Manuela Ferreira Leite falou, é que ouvi alguém dizer as palavras "Estatuto", "Tribunal Constitucional".

Anónimo disse...

Na verdade ficou tudo à nora.